quinta-feira, 27 de junho de 2013

QUE BAITA BOSTA!


                                                 

 Que baita bosta! Em meus devaneios dá uma vontade de inventar um protesto coletivo e com muita algazarra contra a morte.

Essa carnívora inevitável nunca mudou a sua forma de levar quem amamos. Sorrateira, inexorável, implacável.

Na maioria das vezes, principia seus objetivos com uma doença ( dos mais variados matizes) que transforma todo sofrimento e esperança em uma dor definitiva e dilacerante que temos que confortar com alguma crença religiosa ou ideia de um mundo no além ( outra vida, etc).

Em outras tantas, surge tragicamente e acompanhada de um sofrimento e uma dor ainda maior. Tanto e a tal ponto que chega a ofuscar e torna impossível toda forma de entendimento ou tentativa de explicação.

A tragédia na Boate Kiss é um exemplo que será eterno.

Que baita bosta!
 Bem que a gente poderia morrer de forma diferente. Bem que poderia morrer de forma diversa quem a gente tanto ama. Sumir de repente, ficar encantado como nos dizia Guimarães Rosa ou algo que não causasse um vazio tão despedaçador.

Mas, tal como os protestos quase nada se modificará em termos de mudar realmente a realidade que temos.
A morte é uma terrível e boa ( segundo alguns místicos) certeza.

Prosseguirá a crua e dura realidade.

E a morte, tal como a desigualdade e a exploração prosseguirá da mesma forma. Da mesma forma que os CALHEIROS, SARNEIS, COLLORS e MENSALEIROS continuarão a mandar no País.

E a ILUSÃO, a ESPERANÇA e a FÉ serão os únicos e inevitáveis ingredientes  que continuarão dando razões e  um mínimo de sentido para continuarmos vivos.

Mas, fica o inútil protesto!

Que baita bosta é a morte ( principalmente de quem tanto amamos) e as coisas que nunca se modificarão.

Vai com Deus meu grande amigo!!

 

terça-feira, 25 de junho de 2013

SONHO DESESPERADOR.



                                                

Acho que foi Carl Gustav Jung quem afirmou que os sonhos expressam aquilo que o inconsciente assimila de tudo que vivemos e experimentamos em nosso dia a dia, ao mesmo tempo em que se constitui numa espécie de reação a estas experiências.

Pois sobre os tais protestos e movimentos que ocorreram no Brasil inteiro tive um sonho desesperador: pesadelo.

O cenário era de uma verdadeira batalha de acusações recíprocas onde os pretensos candidatos se ofendiam, caluniavam e difamavam de tal forma que não restava um único honesto e completamente “limpo” e que fosse digno de um voto.

Ocorria uma espécie de “ briga de bugios” com um grupo jogando merda na cara do outro.

O LULA tinha um filho que era dono de várias propriedades no Brasil e tudo adquirido de forma estranha, inexplicável e amiúde duvidosa. Várias notícias ligavam tamanha façanha a vários esquemas de corrupção.

O PT era culpado pelo famigerado MENSALÃO que é considerado como o maior esquema de corrupção da República, sendo que tudo se constituía em argumentos para desacreditar e desaconselhar o voto na  DILMA.

Por outro lado, o AÉCIO NEVES ( PSDB) figurava na mesma classificação. Acusado de improbidade administrativa pelo desvio de milhões em seu Governo e por ser integrante do grupo de FHC que segundo registros patrocinou a maior dilapidação do patrimônio público da história, com as conhecidas privatizações bilionárias que só proporcionaram lucros para a iniciativa privada e os grandes capitalistas, sem falar dos inúmeros outros escândalos de desvios de dinheiro público.

Também não faltou em meu sonho o dito EDUARDO CAMPOS ( PSB) denominado de “ NOVO COLLOR”. De olhos azuis, bem vestido, moderninho e que surge exatamente em um momento de crise ( tal como o COLLOR) e que em seu discurso nitidamente prometia “ acabar com a corrupção” e “ consertar o Brasil” fazendo recordar os discursos do Fernando que morava na famosa “Casa da Dinda” e que igualmente prometia acabar com os Marajás.
Pra piorar, esse último também não era " TRIGO LIMPO", sendo que havia feito uma grande fortuna sem explicação convincente, existindo suspeitas de que também estava inserido em algum esquema de corrupção.

Seria um novo impostor se aproveitando do momento delicado em que vive o povo brasileiro e se anunciando como o “ SALVADOR DA PÁTRIA”??

Então, com uma angústia imensa em determinado momento de meu sonho ( pesadelo) entrei em profunda crise.

Dentre tantos supostos corruptos em quem votar? No menos corrupto?

Mas, será que existe uma escala de corrupção ou toda forma de corrupção deve ser intolerável e inaceitável?

“Será que o “Brasil melhor” que desejamos é votar no ” menos corrupto” e aceitar que a corrupção sempre ( de uma forma ou outra) existirá?

E torturado com esse tiroteio de indagações e constatações nas quais todos os pretensos candidatos chafurdavam-se no mesmo lamaçal: onde não mais existiam os “ PUROS” e “ SANTOS”... acabei acordando.

Então de pronto cheguei a conclusão que tudo desemboca na velha política de sempre: onde os mesmos de sempre se acusam com o único propósito de chegar ao Poder.

A destruição da imagem e dos feitos do outro acrescido da promessa de transformar o Brasil em um “ MUNDO ENCANTADO” constituem ingredientes indispensáveis para alcançar tais objetivos.

Depois da vitória?? Fazer tal como O LEOPARDO de G. Lampedusa, ou seja: “ tudo deve mudar para que fique exatamente como está”.

E segue o barco da vida no vasto rio da existência!




  


sexta-feira, 21 de junho de 2013

ARTESANATO DA DOR..



JAZIGO DE SI MESMA eis a casa velha da foto. É uma resistência ao progresso. Um sofrimento estático que fatalmente será sepultada e substituída por um prédio comercial, uma casa moderna, etc.
A dita casa resiste! É um deboche ao novo Ijuí. Em seu porão, muitos fantasmas perambulando errantes, contando seus dramas familiares, alegrias, comemorações e infortúnios vários. Quantos nela residiram? Por qual razão chegou a tal ponto de decomposição e decrepitude?
As casas, tal como acontece com os homens, também morrem. Os homens têm a vantagem da crença na imortalidade. Serve de consolo.
Tudo tem o seu auge e o seu declino, ocaso. Óbvio! Dói constatar isso no simbolismo de uma moradia. A casa tem numeração 885. Números quase apagados, tal como todo um significativo passado que se apaga com a hoje arruinada construção.
O luto se aproxima! Luto inevitável! Confesso que sequer preciso adentrar a dita tapera e já conheço o seu interior. Algo de uma vida passada? Talvez eu tenha morado ali, pois acredito na reencarnação de acordo com a doutrina espírita.
Tivesse algum poder  tombaria (no sentido jurídico de proteção, tornar indestrutível e preservada) a referida casa. Seria intocável e preservada. Seria uma parte de Ijuí não conspurcada pelo dito progresso. Um contraponto ao novo. Um pequeno universo plasmado a evidenciar que nem tudo segue o mesmo caminho e destino.
Mas, que nada! Grande ilusão! Vai preponderar uma nova paisagem. O capital tudo esmaga e corrompe e logo a tapera não mais existirá. Ficará apenas na memória dos que nela viveram, de quem a viu e nas fotografias existentes, tais como as que ficam nesse arquivo desse blog.
E tudo acaba virando arquivo. Até o Bill Gates! Tal casa é um pouco da melancolia que a finitude nos causa. Resistimos com a consciência de que breve estaremos tal como essa casa: velhos, decrépitos a caminho do inevitável. Viraremos mera recordação na memória de quem nos conheceu e amou ou permaneceremos em alguma fotografia em algum álbum embotado  pela  inegociável e irrevogável ação  do tempo.
E assim seguimos: fazendo artesanato da dor.
E parece que vejo e ouço o sinistro corvo da poesia de Edgar Allan Poe (com a sua irredutível ideia de irreversibilidade das coisas) sentenciando:
– NEVER MORE! NEVER MORE! NEVER MORE!
 
Escrito por LUIS FERNANDO ARBO.

terça-feira, 18 de junho de 2013

VERGONHEIRA DANADA..


                                                      

                                                 

Se em tais protestos a grande maioria é realmente pacífica, então deveriam controlar a minoria selvagem e baderneira que patrocina atos deploráveis de vandalismo e violência.

Não fazendo isso demonstram que não possuem CONTROLE ALGUM e organização alguma sobre os participantes e isso se torna imensamente PERIGOSO.

Demonstram que falharam na divulgação dos propósitos pacíficos de tais manifestações. Tanto é verdade que a denominada “MINORIA BADERNEIRA” em nenhum momento se identificou como sendo de “ OUTRO GRUPO”. Muito pelo contrário: se intitulam pertencentes ao grande grupo: tanto que caminham ou caminhavam sempre juntos.

Se realmente são integrantes ( tanto que caminhavam juntos) então comprometem a CREDIBILIDADE e a SINCERIDADE de todo o grupo.

E as inúmeras depredações de prédios públicos, bancos , automóveis, ônibus, prédios históricos e do patrimônio particular fica debitada na conta de todo o movimento, TISNANDO significativamente a ideia de “ BONS PROPÓSITOS”.

E todo o movimento resta ( de certa forma) responsabilizado ( mesmo que moralmente) exatamente pela IMPOTÊNCIA em controlar seus próprios integrantes.

E tudo vira uma grande ANARQUIA: sem controle e onde os próprios integrantes não se entendem em seus objetivos.

Os protestos e manifestações só terão CREDIBILIDADE e RESPEITO quando os que caminham juntos tenham propósitos iguais ( reivindicar direitos pacificamente e com educação).

Do jeito que está? Vergonheira danada..

 

 

segunda-feira, 17 de junho de 2013

FILHO DA P...??


                                                                                                      

Alguém já disse que o ódio é o mais contundente dos pecados capitais, sendo o responsável por desarmonias que só resultaram em tragédias e na retroalimentação da violência cotidiana.

O frade agostiniano João Gregório considerava o ódio como uma arma do demônio.

E esse é o único ponto que tira a credibilidade dos movimentos e manifestações sociais que reivindicam seus direitos.

A depredação do patrimônio particular ou público é a manifestação do mais puro barbarismo e, por óbvio, de um ódio que só faz demonstrar a falta de educação e ignorância dos seus autores.

Chamar policiais de “ FDP” certamente não é a forma mais adequada de protestar contra os abusos cometidos, sendo apenas uma troca de erros que certamente engatilham sentimentos de vingança ou de mais violência.

Segundo alguns, o ódio é um sentimento natural e primitivo tal como é a sede e o próprio amor.

Todavia, esse GIGANTE RUBRO (IRA- ÓDIO) a que se refere muito bem  Mira Y López deve ser controlado sempre. E controlado até como uma forma e finalidade de desenvolvimento de uma CULTURA DE EDUCAÇÃO EMOCIONAL.

Calha também a lição de Joaci Góes em seu ANATOMIA DO ÓDIO quando afirma: “ se o ódio e, eventualmente, a agressão são inevitáveis , impõe-se o desenvolvimento de uma cultura que não permita seu construtivo e benéfico extravasamento , para a sociedade e para o próprio odiendo, visão que exclui ignorá-los ou suprimí-los, mas que haja a valorização e aprendizado de técnicas que nos habilitam a lidar com as situações geradoras de ódio, em qualquer ambiente, como na família e no trabalho, sem perder de vista o quanto importa saber de que pode ser feito para impedir ou reduzir a emergência de situações que causam frustrações e injustiças, fatores que geram ansiedade e ódio.

Em palavras mais simples, toscas e diretas: da mesma forma que a cidadania evoluiu a ponto de os cidadãos se organizarem e reivindicarem seus direitos com ênfase a ponto de serem escutados pelas autoridades constituídas, devem também evoluir e em um ato de civismo ( demonstrando que também cumprem as leis e por isso merecem total credibilidade e respeito) devem evitar manifestações agressivas, vandalismos e o uso de expressões que só fazem demonstrar que não evoluíram nada em termos de educação e respeito.

A cidadania deve andar junto com o civismo.

Quem exige seus direitos também deve cumprir suas obrigações.

Em Provérbios 15:1, Salomão o grande sábio afirma: “ A RESPOSTA BRANDA DESVIA O FUROR, MAS A PALAVRA DURA SUSCITA A IRA”

Tal escrito de mais de dois mil anos deveria obrigatoriamente constar nos cartazes de todas as manifestações sociais.

Precisamos evoluir nesse ponto.

sexta-feira, 14 de junho de 2013

ISSO DE MATAR POR MULHER...

                                                                                                   

Esse negócio de o vivente se matar ou matar por mulher, principalmente nos tempos atuais, retrata ou uma patologia das mais graves ou uma idiotice sem iguala.

O mundo tem mulher “ pra dar com pau” . É tanta que dependendo do talento  do sujeito ele tem que refugar algumas, pois a poligamia sofre acentuado desprezo  em nossa sociedade.

Se a relação terminou, então é a liberdade que se apresenta sorridente. O jeito é um “desencanar” do outro e ser feliz com as inúmeras outras oportunidades que certamente surgirão.

Relações, principalmente as baseadas no sexo e “deleites da carne” ( inúmeras idas a Motéis, calcinhas sensuais, Kama Sutra e outras salamandras) geralmente se desgastam e esgotam em curto ou médio espaço de tempo.

O término se torna uma forma de ambos respirarem um pouco e viverem novas aventuras. Já não há mais nada a aproveitar da relação que restou murcha e esvaziada.

Nesses momentos de esgotamento da relação, o homem e a mulher deveriam dar graças a Deus que a prisão que prendia um ao outro foi revogada.

Só mesmo um homem fraco e sem o mínimo de talento para uma nova conquista fica eternamente vinculado a ex-namorada, companheira ou mulher.

E pior: denomina esse sentimento patológico de amor.

E quando não correspondido ou magoado minimamente, manifesta a sua ira e fúria em forma de extrema violência que geralmente termina em tragédia ( como ocorrem em tantos casos relatados pela mídia).

Sinceramente, complexo entender como um homem pode matar por ter “perdido uma mulher para outro”.


Se já aproveitou o que tinha pra aproveitar, antes deveria soltar foguetes e prosseguir a vida com o máximo de otimismo e alegria possíveis. Perder, nesse caso é libertar-se de algo que já se tornou monótono e sem mais nada para apresentar exceto a repetição: repetição das mesmas discordâncias, dissabores e energias que estão em rota de colisão.

Mulher nunca deve ser um problema. Mulher é sempre solução!

E elas estão por ai aos milhares: gostosas, lindas, maravilhosas.

 

quarta-feira, 12 de junho de 2013

PORTEIRO DO PUTEIRO..

 
Não havia no povoado pior emprego do que 'porteiro da zona'. 
Mas que outra coisa poderia fazer aquele homem? 
O fato é que nunca tinha aprendido a ler nem escrever, não tinha nenhuma outra atividade ou ofício. 
Um dia, entrou como gerente do puteiro um jovem cheio de idéias, criativo e empreendedor, que decidiu modernizar o estabelecimento. 
Fez mudanças e chamou os funcionários para as novas instruções. 
Ao porteiro disse: 
- A partir de hoje, o senhor, além de ficar na portaria, vai preparar um relatório semanal onde registrará a quantidade de pessoas que entram e seus comentários e reclamações sobre os serviços. 
- Eu adoraria fazer isso, senhor, balbuciou - Mas eu não sei ler nem escrever. 
- Ah! Quanto eu sinto! Mas se é assim, já não poderá seguir trabalhando aqui. 
- Mas senhor, não pode me despedir, eu trabalhei nisto a minha vida  inteira, não sei fazer outra coisa.
- Olhe, eu compreendo, mas não posso fazer nada pelo senhor. Vamos dar-lhe uma boa indenização e espero que encontre algo que fazer. Eu sinto muito e que tenha sorte. 
Dito isso, deu meia volta e foi embora. O porteiro sentiu como se o mundo desmoronasse. Que fazer? 
Lembrou que no prostíbulo, quando quebrava alguma cadeira ou mesa, ele a arrumava, com cuidado e carinho. 
Pensou que esta poderia ser uma boa ocupação até conseguir um emprego. 
Mas só contava com alguns pregos enferrujados e um alicate mal conservado. 
Usaria o dinheiro da indenização para comprar uma caixa de ferramentas completa. 
Como o povoado não tinha casa de ferragens, deveria viajar dois dias em uma mula para ir ao povoado mais próximo para realizar a compra. E assim fez. 
No seu regresso, um vizinho bateu à sua porta: 
- Venho perguntar se você tem um martelo para me emprestar. 
- Sim, acabo de comprá-lo, mas eu preciso dele para trabalhar, já que...  
 - Bom, mas eu o devolverei amanhã bem cedo. 
 - Se é assim, está bem. 
Na manhã seguinte, como havia prometido, o vizinho bateu à porta e disse: 
- Olha, eu ainda preciso do martelo. Porque você não o vende para mim? 
- Não, eu preciso dele para trabalhar e além do mais, a casa de ferragens  mais próxima está a dois dias de viagem, de mula. 
- Façamos um trato - disse o vizinho. 
Eu pagarei os dias de ida e volta, mais o preço do martelo, já que você está sem trabalho no momento. Que lhe parece? 
Realmente, isto lhe daria trabalho por mais dois dias. Aceitou. 
Voltou a montar na sua mula e viajou. 
No seu regresso, outro vizinho o  esperava na porta de sua casa. 
- Olá, vizinho. Você vendeu um martelo a nosso amigo. 
Eu necessito de algumas ferramentas, estou disposto a pagar-lhe seus dias de viagem,  mais um pequeno lucro para que você as compre para mim, pois não disponho de tempo para viajar para fazer compras. 
Que lhe parece? 
O ex-porteiro abriu sua caixa de ferramentas e seu vizinho escolheu um alicate, uma chave de fenda, um martelo e uma talhadeira. Pagou e foi embora. E nosso amigo guardou as palavras que escutara: 'não disponho de tempo para viajar para fazer compras'. 
Se isto fosse certo, muita gente poderia necessitar que ele viajasse para trazer as ferramentas. 
Na viagem seguinte, arriscou um pouco mais de dinheiro, trazendo mais ferramentas do que as que já havia  vendido. 
De fato, poderia economizar algum tempo em viagens. 
A notícia começou a  se espalhar pelo povoado e muitos, querendo economizar a viagem, faziam  encomendas. 
Agora, como vendedor de ferramentas, uma vez por semana viajava e trazia o que precisavam seus clientes. 
Com o tempo, alugou um galpão para estocar as ferramentas e alguns meses depois,  comprou uma vitrine e um balcão e transformou o galpão na primeira  loja de ferragens do povoado. Todos estavam contentes e compravam dele. 
Já não viajava, os fabricantes lhe enviavam os pedidos. Ele era um bom cliente. Com o tempo, as pessoas dos povoados vizinhos preferiam comprar na sua loja de ferragens, a ter de gastar dias em viagens. 
Um dia ele lembrou de um amigo seu que era torneiro e ferreiro e pensou que este poderia fabricar as cabeças dos martelos. 
E logo, por que não, as chaves de fendas, os alicates, as talhadeiras, etc ... 
E após foram os pregos e os parafusos... 
Em poucos anos, ele se transformou, com seu trabalho, em um rico e próspero fabricante de ferramentas. 
Um dia decidiu doar uma escola ao povoado. 
Nela, além de ler e escrever,  as crianças aprenderiam algum ofício. 
No dia da inauguração da escola, o prefeito lhe entregou as chaves da cidade, o abraçou e disse:
- É com grande orgulho e gratidão que lhe pedimos que nos conceda a honra de colocar a sua assinatura na primeira página do livro de atas desta nova escola. 
- A honra seria minha, disse o homem. Seria a coisa que mais me daria prazer, assinar o livro, mas eu não sei ler nem escrever, sou  analfabeto. 
- O Senhor? disse incrédulo o prefeito. O senhor construiu um  império industrial sem saber ler nem escrever? Estou abismado.  Eu pergunto: 
- O que teria sido do senhor se soubesse ler e escrever? 
- Isso eu posso responder, disse o homem com toda a calma: - Se eu soubesse ler e escrever... ainda seria o 
PORTEIRO DO PUTEIRO
Essa história é verídica, e refere-se a um grande industrial chamado... Valentin Tramontina,
fundador das Indústrias Tramontina, que hoje tem 10 fábricas, 5.500 empregados, produz 24 milhões de unidades variadas por mês e exporta com marca própria para mais de 120 países – é a única empresa genuinamente brasileira nessa condição. A cidadezinha citada é Carlos Barbosa, e fica no interior do Rio Grande do Sul.
-------------------------------------------------------------------- 

VELHOS ADOLESCENTES..

                                                 

 O mundo atual é pródigo em situações inusitadas em todos os sentidos, referências e modos de pensar, agir, sentir e viver. Temos a cada dia a formação de “múltiplas tribos” e uma diversidade tão diversa que a cada dia é possível se identificar uma nova modalidade desse fenômeno.
Temos as “gurias sensualizadas precocemente” que acham cada vez mais normal se exibir no Facebook mostrando o bumbum, pernas, barriguinha comportando-se como em uma verdadeira competição de quem se mostra mais e melhor.
Pois agora tem o grupo dos “velhos adolescentes”. Aqueles que nunca querem envelhecer e fazem de tudo para permanecer eternamente jovens: forever Young.
E para tal propósito vale de tudo. Cremes rejuvenescedores, corte de cabelo arrepiado, “roupas descoladas” e até mascar chicletes são manifestações frequentes.
E isso vai muito além da Síndrome do Peter Pan, pois tem uns com mais de 40 anos com comportamento de adolescente. É como se tivessem ficado plasmados na faixa que vai dos 18 aos 25 anos.
Basta um emprego com boa renda e o resto é agitar e agitar. Viver espalhafatosa e sempre procurando um "destaque", nem que seja o mais ridículo de todos.
Isso explica o som alto em altas horas da madrugada, a derrapagem de pneus e os exibicionismos automobilísticos patrocinados por verdadeiros homens com comportamento de piá.
Em tudo colocam um ar de desespero, urgência e exibição.
No que toca ao aspecto da aparência, tirando as demais traquinagens, até que ando simpatizando com os adeptos de tal modalidade de comportamento.
Já ultrapassei os 30 anos e esses dias, por ter colocado um boné e ficar escorado em um automóvel em frente de um Posto de Combustível ( experiência que resolvi fazer) uma moça jurou que eu não tinha mais que 25 anos.
Fiquei imensamente feliz!!
Estou virando um velho- adolescente! Hehehe
E segue o barco da vida no vasto rio da existência..
 

sexta-feira, 7 de junho de 2013

O VALOR DA ESCASSEZ NO TEMPO..

 
 
Não faz muito tempo empreendi, num dia de verão, uma caminhada através de campos sorridentes na companhia de um amigo taciturno e de um poeta jovem mas já famoso. O poeta admirava a beleza do cenário à nossa volta, mas não extraía disso qualquer alegria. Perturbava-o o pensamento de que toda aquela beleza estava fadada à extinção, de que desapareceria quando sobreviesse o inverno, como toda a beleza humana e toda a beleza e esplendor que os homens criaram ou poderão criar. Tudo aquilo que, em outra circunstância, ele teria amado e admirado, pareceu-lhe despojado de seu valor por estar fadado à transitoriedade.
A propensão de tudo que é belo e perfeito à decadência, pode, como sabemos, dar margem a dois impulsos diferentes na mente. Um leva ao penoso desalento sentido pelo jovem poeta, ao passo que o outro conduz à rebelião contra o fato consumado. Não! É impossível que toda essa beleza da Natureza e da Arte, do mundo de nossas sensações e do mundo externo, realmente venha a se desfazer em nada. Seria por demais insensato, por demais pretensioso acreditar nisso. De uma maneira ou de outra essa beleza deve ser capaz de persistir e de escapar a todos os poderes de destruição.
Mas essa exigência de imortalidade, por ser tão obviamente um produto dos nossos desejos, não pode reivindicar seu direito à realidade; o que é penoso pode, não obstante, ser verdadeiro. Não vi como discutir a transitoriedade de todas as coisas, nem pude insistir numa exceção em favor do que é belo e perfeito. Não deixei, porém, de discutir o ponto de vista pessimista do poeta de que a transitoriedade do que é belo implica uma perda de seu valor.
Pelo contrário, implica um aumento! O valor da transitoriedade é o valor da escassez no tempo. A limitação da possibilidade de uma fruição eleva o valor dessa fruição. Era incompreensível, declarei, que o pensamento sobre a transitoriedade da beleza interferisse na alegria que dela derivamos. Quanto à beleza da Natureza, cada vez que é destruída pelo inverno, retorna no ano seguinte, do modo que, em relação à duração de nossas vidas, ela pode de fato ser considerada eterna. A beleza da forma e da face humana desaparece para sempre no decorrer de nossas próprias vidas; sua evanescência, porém, apenas lhes empresta renovado encanto. Um flor que dura apenas uma noite nem por isso nos parece menos bela. Tampouco posso compreender melhor por que a beleza e a perfeição de uma obra de arte ou de uma realização intelectual deveriam perder seu valor devido à sua limitação temporal. Realmente, talvez chegue o dia em que os quadros e estátuas que hoje admiramos venham a ficar reduzidos a pó, ou que nos possa suceder uma raça de homens que venha a não mais compreender as obras de nossos poetas e pensadores, ou talvez até mesmo sobrevenha uma era geológica na qual cesse toda vida animada sobre a Terra; visto, contudo, que o valor de toda essa beleza e perfeição é determinado somente por sua significação para nossa própria vida emocional, não precisa sobreviver a nós, independendo, portanto, da duração absoluta.
Essas considerações me pareceram incontestáveis, mas observei que não causara impressão quer no poeta quer em meu amigo. Meu fracasso levou-me a inferir que algum fator emocional poderoso se achava em ação, perturbando-lhes o discernimento, e acreditei, depois, ter descoberto o que era. O que lhes estragou a fruição da beleza deve ter sido uma revolta em suas mentes contra o luto. A idéia de que toda essa beleza era transitória comunicou a esses dois espíritos sensíveis uma antecipação de luto pela morte dessa mesma beleza; e, como a mente instintivamente recua de algo que é penoso, sentiram que em sua fruição de beleza interferiam pensamentos sobre sua transitoriedade.
O luto pela perda de algo que amamos ou admiramos se afigura tão natural ao leigo, que ele o considera evidente por si mesmo. Para os psicólogos, porém, o luto constitui um grande enigma, um daqueles fenômenos que por si sós não podem ser explicados, mas a partir dos quais podem ser rastreadas outras obscuridades. Possuímos, segundo parece, certa dose de capacidade para o amor – que denominamos de libido – que nas etapas iniciais do desenvolvimento é dirigido no sentido de nosso próprio ego. Depois, embora ainda numa época muito inicial, essa libido é desviada do ego para objetos, que são assim, num certo sentido, levados para nosso ego. Se os objetos forem destruídos ou se ficarem perdidos para nós, nossa capacidade para o amor (nossa libido) será mais uma vez liberada e poderá então ou substituí-los por outros objetos ou retornar temporariamente ao ego. Mas permanece um mistério para nós o motivo pelo qual esse desligamento da libido de seus objetos deve constituir um processo tão penoso, até agora não fomos capazes de formular qualquer hipótese para explicá-lo. Vemos apenas que a libido se apega a seus objetos e não renuncia àqueles que se perderam, mesmo quando um substituto se acha bem à mão. Assim é o luto.
Minha palestra com o poeta ocorreu no verão antes da guerra. Um ano depois, irrompeu o conflito que lhe subtraiu o mundo de suas belezas. Não só destruiu a beleza dos campos que atravessava e as obras de arte que encontrava em seu caminho, como também destroçou nosso orgulho pelas realizações de nossa civilização, nossa admiração por numerosos filósofos e artistas, e nossas esperanças quanto a um triunfo final sobre as divergências entre as nações e as raças. Maculou a elevada imparcialidade da nossa ciência, revelou nossos instintos em toda a sua nudez e soltou de dentro de nós os maus espíritos que julgávamos terem sido domados para sempre, por séculos de ininterrupta educação pelas mais nobres mentes. Amesquinhou mais uma vez nosso país e tornou o resto do mundo bastante remoto. Roubou-nos do muito que amáramos e mostrou-nos quão efêmeras eram inúmeras coisas que consideráramos imutáveis.
Não pode surpreender-nos o fato de que nossa libido, assim privada de tantos dos seus objetos, se tenha apegado com intensidade ainda maior ao que nos sobrou, que o amor pela nossa pátria, nossa afeição pelos que se acham mais próximos de nós e nosso orgulho pelo que nos é comum, subitamente se tenham tornado mais vigorosos. Contudo, será que aqueles outros bens, que agora perdemos, realmente deixaram de ter qualquer valor para nós por se revelarem tão perecíveis e tão sem resistência? Isso parece ser o caso de muitos de nós; só que, na minha opinião, mais uma vez, erradamente. Creio que aqueles que pensam assim, de e parecem prontos a aceitar uma renúncia permanente porque o que era precioso revelou não ser duradouro, encontram-se simplesmente num estado de luto pelo que se perdeu. O luto, como sabemos, por mais doloroso que possa ser, chega a um fim espontâneo. Quando renunciou a tudo que foi perdido, então consumiu-se a si próprio, e nossa libido fica mais uma vez livre (enquanto ainda formos jovens e ativos) para substituir os objetos perdidos por novos igualmente, ou ainda mais, preciosos. É de esperar que isso também seja verdade em relação às perdas causadas pela presente guerra. Quando o luto tiver terminado, verificar-se-á que o alto conceito em que tínhamos as riquezas da civilização nada perdeu com a descoberta de sua fragilidade. Reconstruiremos tudo o que a guerra destruiu, e talvez em terreno mais firme e de forma mais duradoura do que antes.
 
Esse texto que tem o nome " SOBRE A TRANSITORIEDADE" foi escrito por Sigmund Freud. Texto que transformei em quadro e que está na parede do meu apartamento pois é sempre atual.

quinta-feira, 6 de junho de 2013

HOMO STUPIDUS

 

Por Lenio Luiz Streck

O homo estupidus de CopacabanaAlguns dias atrás, quando cheguei no Rio de Janeiro, fui surpreendido com uma notícia chocante, bizarra. Mais uma envolvendo animais: um homem tinha jogado pela janela de um apartamento, localizado no sexto andar de um prédio em Copacabana, dois cães. Ambos morreram na queda. Havia, como não poderia deixar de ser, um clima de consternação e de revolta. Nem mesmo a agradável brisa da “Princesinha do Mar” foi suficiente para amainar o ar pesado que se respirava. Registro que, em Porto Alegre, dias antes, uma mãe foi filmada maltratando um cão, em que, além disso, ela “ensinava” ao filho como bater no bichinho.[2]
O autor do ato alegou que viu um vulto passar e depois os cães caíram. Não se recorda de ter precipitado os animais. A família afirma que o sujeito apresenta problemas de saúde, de consciência, que toma remédios, e que já teria investido contra a filha. Os animais, confirmaram vizinhos e parentes, eram dóceis, não atacaram, não investiram contra a vida do seu algoz. Sem justificativa, uma explicação que se costuma aventar (e, como visto, foi efetivamente apresentada) é a insanidade.
Senti vergonha da condição de homo sapiens. E senti que precisava escrever algo a respeito da antítese do homo sapiens: o homo estupidus. Uma infeliz e a um só tempo boa oportunidade para levantar algumas questões que já de algum tempo vêm ocupando um espaço progressivo na academia jurídica brasileira. E que vem me preocupando também. A problemática jurídica (se quisermos, podemos chamar de problemática jurídico-moral) dos animais. Afinal, quem (ou o que) foi arremessado para a morte daquela janela de Copacabana? Quem eram aqueles seres, vivos até então? O que faziam em um apartamento? Um pastor alemão! E pensei como o processo de domesticação (muitas vezes sofrido para os domesticados, é preciso ressaltar, inclusive com a perda de inúmeras vidas) levou a que tenhamos, na vida urbana contemporânea, animais vivendo em ambientes eminentemente humanos: com pouco espaço, sem terra para cavar ou brincar, totalmente dependentes da comida e da água que fornecemos e de algum tempo de aparente liberdade quando os levamos a passear pelas coleiras (somos os seus senhores).
Quem são os animais...Definimos até a vida sexual dos animais: se copularão ou não. É mesmo uma imensa necessidade de companhia e uma necessidade por companhia não humana; o animal que supre uma solidão, sem que a própria companhia humana pudesse substituí-lo. As relações são distintas: não precisamos simplificar ou hierarquizar para concluir que o animal está lá porque não existe um humano em seu lugar, como se ele, o animal, fosse uma segunda opção. Mas, mesmo assim, não queremos que o cão lata, pois nos incomoda ou a vizinhança, e deste modo podemos comprar coleiras que dão choque caso o cão se aventure a latir (que folgado, que abusado!). Descobri que se fazem cirurgias para extrair as cordas vocais dos cães, para que...não latam. Uau! Tudo isto naturalizado. E o que está normalizado corre o risco de não ser mais percebido criticamente, de não gerar mais indignação, como advertia Bertold Brecht.
Costumamos empregar à palavra predador um sentido negativo. Mas não paramos para atentar que o predador tem motivos para fazê-lo. Tem, por necessidade de sobrevivência, que matar e devorar outro ser para poder sobreviver. Portanto, não há mal em ser carnívoro. Mas somente o ser humano (ou animal humano, como queriam alguns) mata por prazer ou perversão. Quem é o animal em um safári? Numa tourada? Ou nas hoje abandonadas (e ainda bem) “farras do boi”? Em todos esses casos o molestar, ferir e matar faziam parte de uma espécie de catarse pública em busca do mórbido, tudo sob a máscara da violência simbólica — de que se trata(va) de uma tradição.
É bem verdade que nós, animais humanos, temos uma compreensão mais evoluída que os demais — sabemos que somos um ser-para-a-morte, no dizer de Heidegger. Sabemos de nossa finitude e, por isso, podemos buscar um sentido para nossa vida — embora tanto consigam encontrar sentidos sem sentido... Mas os animais não humanos possuem alguns desejos em comum, como o de alimentação, abrigo, companhia, ter liberdade de movimentos e de não sentir dor. O especismo[3] é, em si, uma violência.
Parafraseando então o filósofo da desconstrução Derrida, que indagou Quem é este gato que me olha nu?, em célebre conferência depois publicada, me veio a pergunta: quem eram aqueles cães,donos (voltarei a isto) dos corpos atirados pela janela? Eles tinham expectativas que foram ceifadas? A vida deles era boa? E não pude deixar de imaginá-los como filhotes... As brincadeiras que devem ter feito, os medos que sentiram e o afeto por seres humanos que devem ter experimentado. Pois tudo acabou ali, na mesma noite em que voava chegando ao Rio. Eles não voaram.
Mas não quero aqui adotar um tom sentimentalista ou choroso, embora seja certo que costumamos empregar esta palavra para desqualificar sentimentos em relação aos animais quando a evitamos, em situações paralelas, para seres humanos. Não esqueço disso. De jeito nenhum. Tem gente que maltrata não só animais... Bem, a conduta é crime (e não contravenção), está prevista no artigo 32 da Lei 9.605/98, chamada de Lei dos Crimes Ambientais, como maus-tratos. Duas coisas me geraram estranhamento. A primeira: um crime praticado contra um ser vivo, contra dois animais, seres individualizados, pode ser configurado como crime ambiental, infração contra o meio ambiente? A segunda: quem é a vítima deste tipo penal?
Parece estranho que um ato que atenta contra um animal possa ser entendido como um ato contra o ambiente? Sim, pode parecer estranho, mas esta é a compreensão tradicional, arraigada; aquela que esfumaça o ser animal (ou o animal não humano) no todo: o que importa é o ecossistema e não o ser individual. Portanto, o que importa é (sempre) o conforto do... homo sapiens. Porém, outra dúvida me assaltou, balançou no trapézio, como a Brás Cubas, quase me derrubando: mas, qual é o dano ambiental (ecossistêmico) causado pela morte de dois cachorros (animais domésticos) que viviam nos apertados metros quadrados de um apartamento de uma megalópole? Fui me convencendo: não parece ser exatamente o que poderia ser chamado de crime ambiental.
Quem é a vítima?A outra interrogação se afigura ainda mais desconcertante. Quem é a vítima? Diz a generalidade dos juristas, ancorados em Kant, a vítima (do ato que tirou a vida dos cães) é a sociedade (humana, claro). É ela que foi agredida no seu senso de civilidade. Ora, bárbaro jogar dois cachorros pela janela: uma desconsideração por aqueles animais, pela vida daqueles animais... Ops! Caí do trapézio: tenho um problema. O crime não foi a rigor cometido contra aqueles animais! Contra a vida deles. Por quê? Ora bolas: porque eles são coisas, objetos de direito. Não são sujeitos. A vida, a rigor, não era deles. Era do seu dono... O corpo deles não era deles. Era... do seu proprietário. Sim, agora tudo parece começar a fazer sentido. Precisamos corrigir a lei, pois não é um crime ambiental, é um crime contra o proprietário da coisa (que, no caso, seria a mãe, não o autor do crime, filho da mãe...).
É no mínimo curioso. Quem sofre a dor é o animal, a vida que se esvai é do animal, mas a vítima não é ele. Um animal que é queimado, que tem a pata ou a língua cortada, que é espancado, como tantos são diariamente, nenhum deles é vítima. Se tem dono, a vítima é o proprietário. Se não tem, se selvagens são considerados, a vítima é a sociedade (direito difuso). Nunca o animal, ele mesmo, em si. Simples assim. Uma engenhoca jurídica para sair do paradoxo de afirmar que o próprio animal é a vítima e ainda assim é objeto.
Ora: vítima não é coisa, é sujeito (de algum direito vitimado, violado). Porém, o meu computador, onde escrevo estas palavras, também é uma coisa. E, em tese, posso jogá-lo pela janela. Se não configurar crime de perigo, nenhum problema. Brinquedos, bonecas etc. podem ser estraçalhados. Nada acontece. Mas, não posso jogar minha cachorra, Dorothy, pela janela, nem cortar a sua cabeça. Por qual motivo não? O cão, meu computador e os antigos brinquedos de minha filha são todos eles, parao senso comum teórico dos juristas, objetos. Todavia, não é, obviamente, crime de maus-tratos se machuco meu computador ou se se quebra uma boneca.
Fiquei com algum desconforto aqui. Algo parecia errado, não encaixar (conceitos e coisas, conceitos sem coisas...). Instigado por este desconforto é que o criminalista argentino Zaffaroni veio recentemente a dizer que a vítima do crime de maus-tratos é o próprio animal. Alguns no Brasil vem dizendo a mesma coisa, como o meu amigo Fábio C. Souza de Oliveira, brilhante professor da Unesa e da UFRJ.[4] Ele e outros defendem o chamado Direito dos Animais. Estou entrando no time. A questão é ampla, diz com o próprio conceito de maus-tratos, mas não se detém aí, vai questionar a utilização regular que a humanidade faz dos animais: animais em circo, rodeios, experimentos científicos, vestuário, alimentação. A pauta é larga e complexa e não é dela que me ocupo aqui.
Voltemos para o crime de maus-tratos: a pena é de 3 meses a um ano e multa. Ou seja: crime de menor potencial ofensivo. Se dos maus-tratos decorre o falecimento do animal, a pena é aumentada de um sexto a um terço. Significa, portanto: o bem jurídico protegido (não o animal, como vimos, e sim o senso de civilidade da humanidade, ou a propriedade viva do ser humano) é considerado de menor relevância.
A relação humano e não-humanosMuitos filósofos já criticaram a relação usual entre humanos e não humanos, de coisificação da vida, de instrumentalização dos animais. O homem é um fim em si, todos repetem em coro uníssono. É o mantra humanista. Só o ser humano. O animal é instrumento para o bem-estar, para a felicidade humana. Logo, não possui dignidade (animal). Muitos, como eu dizia, confrontaram, ao longo do tempo, este status quo. Pitágoras, Plutarco, Porfírio, Jeremy Bentham. Nietzsche disse algo a respeito. Atualmente, no que se denomina de Ética Animal, Tom Regan e Peter Singer, nos Estados Unidos. Uma crítica ao antropocentrismo. Também Heidegger disse algo a respeito. Mas isto fica para outro texto.[5]
O fato é que o Direito dos Animais vem conquistando progressivamente mais espaço, mais adesão, em terras brasileiras e estrangeiras. Não podemos ignorar este fenômeno. Alguns afirmam que animais (alguns, pelo menos) são sujeitos de direito porque são sensíveis, sentem dor, inclusive psicológica, buscam o bem-estar; enfim, são sencientes (ver a The Cambridge Declaration on Consciousness, de 2012, assinada por Philip Low e Stephen Hawking, entre outros). E aí a associação: se são sencientes, são titulares de direitos, porque seus interesses importam para eles próprios ainda que não importe para nenhum ser humano. Verdade automática? Como conversei com Fábio Oliveira, não: no passado não se contestava que negros, índios ou as mulheres eram sencientes (ou conscientes), mas nem por isso a condição de sujeitos de direito lhes foi reconhecida de pronto. Pensemos nos julgamentos das Supremas Cortes dos Estados Unidos (caso Dred Scott, que envergonha o Direito norte-americano até hoje) e do Brasil, em que os escravos foram considerados objetos. Pasmem: a Constituição do Império, de 1824, extinguiu as penas de galés e açoites; o Código Criminal do Império repristinou os castigos. E sabem por que o Código não foi considerado inconstitucional? Por duas razões: a uma, porque o controle era feito pelo Legislativo e isso não funcionou no Império; a duas, porque a Constituição somente se aplicava às pessoas... e não às coisas... E escravos eram res. Estás envergonhado de nosso Direito de antanho? Pois, por certo, daqui há 50 anos, poderemos dizer isso sobre o tratamento dado hoje ao direito dos animais.
Será que é devido reconhecer a condição de sujeitos de direitos aos animais? Em um artigo sobre oEstado Ecológico, Canotilho, por exemplo, deixa a questão em aberto. Mas suscita a pergunta. Bobbio chegou a vaticinar a paulatina escalada em favor desta tese. Será? A Constituição do Equador (2008), em previsão inédita em todo o mundo, enunciou direitos da natureza. Isto é: um sujeito de direitos fora da espécie humana. Mas, como já tive oportunidade de escrever,[6] direitos da natureza não é o mesmo que direitos dos animais. A Constituição da Bolívia (2009) talvez dê espaço para visualizar direitos dos animais.[7] Qué pasa? Será verborragia constitucional ou uma virada de paradigma sendo anunciada (embora não certa)? A matéria é própria do Direito ou fica melhor na esfera da Moral?
Voltando aos cães atirados pela janela...Quero, por fim, voltar para aqueles dois cães jogados pela janela. Suponha que eu tivesse chegado logo depois e lá me deparasse com os corpos no chão, com pessoas ao redor consternadas, chocadas, algumas até chorando. O que poderia fazer? Abraçar qualquer uma destas pessoas e dizer a ela que me solidarizo com o seu senso de civilidade aviltado pelo ato ignóbil. Para outra diria que é revoltante vê-la chorando... Ou até poderia comentar: imagine se algum dos cães caísse sobre alguém! Repetiria, enfim, que nosso sentido de urbanidade foi atacado, que é intolerável a agressão contra a sociedade... Ideias de varejo e de atacado. De todo modo, tudo dentro de um imaginário da banalização do mal... contra pessoas e animais.
E os corpos lá estendidos, ensanguentados, deformados, já cobertos pela polícia? Paisagem. Mas, olhando tudo aquilo, com certeza, eu me colocaria à dúvida quanto ao meu dever moral ou jurídico de levar em consideração seus interesses. Dentre eles o de permanecer vivo.
Em O animal que Logo Sou, Jacques Derrida começa a reflexão indagando acerca do que pensa, se é que pensa, aquele gato que me olha. Aquele gato que me olha nu, trocando de roupa, na intimidade. Quem sou eu para o gato? E quem sou eu para a Dorothy e o Xiru, cães-amigos aqui da casa, e para o Dudu e o Bolinha, que moram lá na Dacha? Mas a pergunta que se põe agora é: o que eu penso olhando para eles? Lembro de uma cena que passou na TV. Perto do final do ano, algumas pessoas descartam animais nas estradas, mormente onde tem muros nas beiras, para deixá-los encurralados. Uma senhora tirou uma sequência de fotos de uma outra senhora que largou um cãozinho nessa estrada entre Porto Alegre e São Leopoldo. Largou-o e ele saiu correndo atrás do carro, como a dizer “se sempre te dei carinho, por que fazes isso comigo agora?”. Para sorte do cãozinho, a senhora que fotograva salvou-o e o levou para casa. Dois tipos de gente: os que descartam e os que abrigam... E salvam. No Inferno de Dante, deve ter um espaço para a senhora do descarte... Ali, bem no último anel.
Nota finalÉ o primeiro texto que escrevo sobre o assunto “direito dos animais” e “relação ser-humano-animal”. Sempre haverá alguém para dizer que “enquanto morrem pessoas por inanição, fome etc. tem gente que fica preocupado com os animais”. Bem sei disso. Mas, não se preocupem. Tenho a certeza que aqueles que cuidam dos direitos dos animais jamais maltratarão ou deixarão que se maltrate um ser humano. Uma coisa leva à outra. E vice-versa.
Quero dizer ao Fábio e a Larissa, assim como ao meu aluno Flávio, todos defensores da causa e a todos que, de um modo ou de outro, se emocionaram com o que escrevi, que estou abraçando a causa também. No fundo, já havia feito isso há muito tempo. Lembro-me que, quando menino, tinha um porco chamado Bolão. Lá no meio do mato, na Várzea do Agudo. E me tiraram o Bolão (não é necessário dizer o que fizeram com ele). Também me lembro que, certo dia, fui fazer queixa ao meu pai contra o único peão que arava o nosso campo, porque ele estava maltratando Cacique e Leão, a junta de bois lá de casa. À noite, ficava alisando o lombo de Cacique, o boi da esquerda, aquele que mais sofria sob a chibata do Negro Pepê. Fábio: obrigado pelas dicas para a coluna. No fundo, sempre já estive na e com a causa.

[1] Quando vejo tanto ódio em corações de algumas pessoas que colocam seus spots raivosos no CONJUR, penso que, exatamente, estou certo na minha admiração pelos animais.
[2] Registro que já há mais de 40 anos, em Porto Alegre, uma senhora, solitariamente, cuidava do direito dos animais. Chamava-se Palmira Gobi. Hoje, a cidade já tem a Secretaria dos Direitos dos Animais, que vem se tornando referência nacional.
[3] Especismo, por analogia ao racismo e ao sexismo, é a atitude preconceituosa de considerar os seres de sua própria espécie como superiores, de modo a não levar em consideração o sofrimento dos demais seres vivos. Sobre o assunto, recomendo o documentário Eathlings (Terráqueos) (informações aqui).
[4] O professor Fábio Corrêa Souza de Oliveira coordena o Centro de Direito dos Animais, Ecologia Profunda, que reúne a UFRJ, a UFF e a UFRRJ. www.animaisecologia.com.br
[5] Fruto do Programa de Pós-Graduação em Direito da Unisinos, o trabalho de Ariel Koch Gomes, a partir de uma reconstrução filosófica, faz uma crítica a este paradigma antropocêntrico, em defesa do direito da natureza. Ver: GOMES, Ariel Koch. Natureza, Direito e Homem: sobre a fundamentação do Direito do Meio Ambiente. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013.
[6] Sobre o tema, ver: STRECK, Lenio Luiz; OLIVEIRA, Fábio. Um Direito Constitucional Comum Latino-Americano – Por uma teoria geral do novo constitucionalismo latino-americano. Revista do Instituto de Hermenêutica Jurídica, v. 11, p. 121-151, 2012.
[7] Art. 33: “Las personas tienen derecho a un medio ambiente saludable, protegido y equilibrado. El ejercicio de este derecho debe permitir a los individuos y colectividades de las presentes y futuras generaciones, además de otros seres vivos, desarrollarse de manera normal y permanente.” Grifo acrescentado.
Lenio Luiz Streck é procurador de Justiça no Rio Grande do Sul, doutor e pós-Doutor em Direito.